quinta-feira, 24 de março de 2011

Roger Waters e o Muro

Carta de Roger Waters, fundador dos Pink Floys e defensor dos direitos dos Palestinianos, apoiante da iniciativa para o Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS):

Em 1980 escrevi uma canção, "Another Brick no Wall Part 2", que foi criticada pelo governo sul-Africano, porque usada pelas crianças negras sul-Africana na defesa dos seus direitos à educação igualitária. O governo do apartheid tinha imposto um bloqueio da cultura, por assim dizer, acerca de algumas canções, incluindo a minha.

Vinte e cinco anos depois, em 2005, as crianças palestinianas que participavam num festival na Cisjordânia, usaram a música para protestar contra o muro do apartheid israelita. Cantaram "Nós não precisamos de ocupação! Nós não precisamos do muro racista". Naquela época eu não tinha visto com os meus próprios olhos o que as crianças cantavam.

Um ano depois, em 2006, programei um concerto em Tel Aviv.

O movimento palestiniano de apoio ao boicote académico e cultural contra Israel convidou-me a reconsiderar o caso. Eu já me tinha pronunciado contra o muro, mas não estava convencido de que um boicote cultural fosse o caminho certo a seguir. Os Palestinianos a favor do boicote sugeriram que eu visitasse os territórios ocupados, para que pudesse ver o muro antes de tomar uma decisão. E aceitei.

Visitei Jerusalém e Belém sob a proteção da ONU. Mas nada poderia ter-me preparado para o que vi naquele dia. O muro é uma construção horrível de ver. É guardada por jovens soldados israelitas que me trataram, eu, um observador casual de outro mundo, com agressividade e desprezo. Se assim foi para mim, um estrangeiro, um visitante, deixo imaginar como poderia ser para os Palestinianos, para as classes mais pobres.
Eu sabia que minha consciência não me teria permitido virar as costas, ao destino dos Palestinianos que conheci, pessoas cujas vidas são esmagadas diariamente pela ocupação israelita, em muitos aspectos. Em solidariedade, apesar de impotente, naquele dia escrevi na parede "Nós não precisamos de nenhum controle de pensamento."

Percebendo então que a minha passagem em Tel Aviv teria involuntariamente legitimado a opressão que tinha testemunhado, cancelei o concerto no estádio de Tel Aviv e mudei-o para Neve Shalom, uma comunidade agrícola, com criação de aves e também de uma forma admirável de cooperação entre pessoas de diferentes religiões, onde Muçulmanos, Cristãos e Judeus vivem e trabalham lado a lado em harmonia.

Contra todas as expectativas, aquele viria a ser o maior evento musical da curta história de Israel. 60.000 apoiantes enfrentaram engarrafamentos e filas no carro só para assistir ao concerto.
Foi muito emocionante para mim e a minha banda, e fiquei muito emocionado no final do concerto, exortando os jovens ali reunidos para exigir do governo deles esforços, para garantir uma resolução de paz com os vizinhos e que fossem respeitados os direitos civis dos Palestinianos residentes em Israel.

Infelizmente, o governo israelita não fez qualquer tentativa para introduzir uma legislação que igualasse os direitos civis dos Árabes Israelitas, para estes possam gozam dos mesmos direitos dos Judeus Israelitas, o Muro levantou-se, mais e mais territórios da Cisjordânia foram ilegalmente anexados .

Naquele dia em Belém, em 2006, eu recebi uma ideia do que significa viver sob a ocupação, preso atrás de uma parede. Significa para um agricultor palestiniano olhar para as seculares oliveiras arrancadas. Significa para o estudante palestinianos não poder chegar à sua escolas, porque o check point está fechado. Significa para uma mulher dar à luz num carro, porque o soldado não deixa ir até o hospital, que está a apenas dez minutos. Significa para o artista palestiniano não poder viajar para o estrangeiro, a expor as suas obras, ou a apresentar um filme num festival internacional.

Para os habitantes de Gaza, na verdade trancados numa prisão, por trás da barreira ilegal israelita, isso significa um outro conjunto de injustiças. Significa que as crianças vão dormir com fome, muitas delas cronicamente desnutridas. Significa que pais e mães, incapazes de trabalhar numa economia dizimada, não têm meios de subsistência para sustentar as próprias famílias. Significa, para os estudantes universitários com bolsas de estudo no estrangeiro, levar em conta a possibilidade de nunca mais voltar a ver os próprios pais porque não autorizados a viajar.

Na minha opinião, o abominável e draconiano controle que Israel exerce sobre os Palestinianos cercados em Gaza e os Palestinianos na Cisjordânia ocupada, combinada com a recusa em reconhecer o direito de regresso dos refugiados às suas casas em Israel, exige o máximo apoio aos Palestinianos na resistência pacífica e civil, o apoio das pessoas "imparciais" de todo o mundo.

Quando os governos se recusam a agir, as pessoas devem fazê-lo através de qualquer meios pacíficos disponíveis. Para alguns, isto significou a adesão à Marcha pela Libertação de Gaza, para outros significou a adesão à Flottilla humanitária que tentou trazer bens essenciais em Gaza.

Para mim, significa declarar a minha intenção de ser solidário não só com os Palestinianos, mas também com os milhares de Israelitas que não compartilham a política racista e colonialista do próprio governo, a adesão à campanha de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra Israel até pelo menos três tipos básicos de direitos humanos e direito internacional não ficarem satisfeitos:

1.O fim da ocupação e da colonização israelita de todos os territórios árabes (ocupados desde 1967) e a destruição do Muro.

2. O reconhecimento dos direitos básicos dos cidadãos árabes-palestinianos de Israel para a plena igualdade.

3. O respeito, a protecção e a promoção dos direitos dos refugiados Palestinianos para que sejam autorizados a regressar às suas casas e os seus bens, conforme estipulado na Resolução 194 da ONU.

A minha convicção está fundamentada na ideia de que todas as pessoas merecem o reconhecimento dos direitos humanitários básicos.
A minha não é uma postura anti-semita. Este não é um ataque contra os Israelitas.
Isto é, no entanto, um apelo para juntar-se ao boicote cultural, dirigido aos meus colegas de trabalho na indústria da música, bem como aos artistas que trabalham em outras áreas.

Os artistas fizeram bem em recusar a actuar na vila de Sun City, em África do Sul, até a queda do apartheid, até negros e brancos poderem desfrutar de direitos iguais.
E nós estamos certos em recusar a actuar em Israel, até que chegue o dia - e certamente chegará- em que o Muro da ocupação irá cair e Palestinianos e Israelitas conviverão em paz, liberdade, justiça e dignidade que todos merecem.

Roger Waters, 25 de Fevereiro de 2011

Fonte: SilviaCattori
Link: BDS Movement (Inglês)

A seguir, os vídeos de "Another Brick In The Wall" e "Dogs" (que não tem nada a ver, mas eu gosto!).






Indicação de um comentário no Informação Incorrecta

Versão bem animada do clássico "Another Brick in the Wall part 2" do Pink Floyd. Este vídeo foi gravado pela TV Bandeirantes de São Paulo num show realizado em 1996 em Barra Bonita, São Paulo.






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