sábado, 10 de agosto de 2013

Ministro Padilha defende encarregado de fiscalizar planos de saúde que trabalhou para plano de saúde e omitiu informação

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O recém-nomeado diretor da ANS, Elano Rodrigues de Figueiredo, omitiu do seu currículo enviado à presidenta Dilma e ao Senado que trabalhou, inclusive como celetista, para planos de saúde. O ministro Alexandre Padilha defendeu-o enfaticamente na reunião do Conselho Nacional de Saúde de 7 de agosto

por Conceição Lemes

A Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS)  tem como missão a defesa do interesse dos usuários de planos de saúde e a regulação das relações entre operadoras e consumidores.
Em 11 de julho, após sabatina e análise do currículo, o Senado aprovou por unanimidade o nome do advogado Elano Rodrigues Figueiredo para o cargo de diretor da ANS. Em 30 de julho, sua nomeação pela presidenta Dilma Rousseff saiu no Diário Oficial da União.
Figueiredo, porém, omitiu do currículo enviado à presidenta principal informação. A de que foi diretor-jurídico da Hapvida, empresa que atua no Nordeste vendendo planos para as chamadas classes C e D, além de ter trabalhado como advogado da Unimed.
Especialistas da área de saúde coletiva e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) denunciaram o caso. Pediram, no mínimo, a anulação da sabatina, pois Figueiredo suprimiu justamente o grave conflito de interesse, que pode impedi-lo de exercer adequadamente as funções de diretor da ANS.
Figueiredo contestou. Inicialmente alegou que, por sigilo contratual, não podia revelar os nomes das empresas para as quais trabalhou. Depois, negou ter trabalhado formalmente para a empresa.
A Hapvida desmentiu-o. Informou ao Estado que Figueiredo foi seu assessor jurídico, como celetista, entre outubro de 2008 a junho de 2010.
O Conselho de Ética da Presidência da República, por determinação de Dilma, abriu investigação para analisar a conduta de Figueiredo e decidir o que fazer.
A Hapvida é uma das empresas com mais reclamações em órgãos de defesa do consumidor. No blog Reclame aqui, há hoje,10 de agosto, 535. Na própria lista da ANS, ocupa o 18º lugar entre as cem operadoras com mais queixas.

ELANO FIGUEIREDO DEFENDE QUE DOENTES PAGUEM MAIS E CRITICA ÓRGÃOS PRÓ-CONSUMIDORES

Uma coisa, no entanto, é irrefutável: Elano Figueiredo tem uma história profissional umbilicalmente ligada à defesa dos planos de saúde contra os consumidores.
Não é só. Em artigo publicado em 2006 na  revista Themis, da Escola Superior da Magistratura do Ceará, ele revela opinião oficial contrária à defesa do interesse público que o cargo de diretor da ANS exige (íntegra,  no final).


Logo de saída, lamuria. Diz que “vai discorrer sobre o desfavorável e amargo momento vivenciado pelos planos de saúde junto ao Judiciário, Órgãos de Defesa do Consumidor e afins”.
Mais adiante discorda da regulação mais rigorosa dos planos de saúde, indispensável para defender os usuários. Tanto que já moveu, em nome de operadoras, ação contra a própria fiscalização da ANS.
“Parece-me exagerada a interferência estatal”, diz Figueiredo no seu texto.


Figueiredo defende que as pessoas doentes paguem mais por planos de saúde. A isso ele chama de “isonomia”.


Para completar, critica os órgãos de defesa do consumidor, por pressionarem a ANS em benefício dos cidadãos e cidadãs usuários de planos de saúde.


Figueiredo quer o quê? Que os órgãos de defesa do consumidor se componham com as operadoras? Façam vista grossa à má assistência? Não denunciem as glosas absurdas e o não ressarcimento criminoso praticado pelos planos contra o SUS?
Mário Scheffer, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), reprova veementemente: “Uma total falta de isenção incompatível com o cargo”.

Mário pesquisa há vários anos decisões judiciais relacionadas à negação de coberturas assistenciais movidas por clientes de planos e seguros de saúde. 

São principalmente negativas de tratamento de câncer e de doenças do coração, exclusão de quimioterapia, cirurgias diversas, exames diagnósticos, órteses e próteses.
“Elano figura em várias ações desse tipo, defendendo planos de saúde contra o direito do cidadão”, alerta. “Talvez por isso ele tenha omitido o nome das empresas para as quais trabalhou – inclusive com carteira assinada — no currículo e na sabatina.”

“Em nota alega sigilo profissional. Piada pronta”,

 detona. “Ora, basta uma busca no google para ver que ele atua como defensor de planos de saúde em dezenas de acórdãos nos tribunais, é informação pública. Não pode, definitivamente, estar à frente de um cargo de diretor da agência que regula os planos.”

SCHEFFER: ”INTRIGANTE A DEFESA INFLAMADA”. ANA COSTA: “GRAVE TENTATIVA DE PRESSÃO” 


Padilha e Ana Costa na reunião do CNS que discutiu a nomeação de Figueiredo para a diretoria da ANS. Para a presidenta do Cebes, o ministro intimidou o Conselho Nacional de Saúde. 
Fotos: Agência Brasil

A ANS é um órgão do Ministério da Saúde. Desse modo, a indicação para a sua diretoria começa no próprio ministério. Depois passa  pelo crivo da Casa Civil e vai à apreciação da Presidência da República, que envia o nome ao Senado, para ser sabatinado. O Senado aprovando, a Presidência faz a nomeação.
Elano Figueiredo, como dissemos no início, foi aprovado.
Porém, a omissão no currículo do conflito de interesse fez com que a sua nomeação fosse discutida na última reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que ocorreu na quarta-feira, 7 de agosto.
Maria do Socorro de Souza, presidente do CNS, defendeu a anulação da sabatina: “O que era exceção está se virando regra. Está prevalecendo a indicação de diretores ligados ao setor privado. Recomendamos, então, que a sabatina [de Figueiredo] seja anulada”.

O ministro de Saúde, Alexandre Padilha, estava presente. Não gostou do que ouviu, pediu a palavra e fez um discurso de cerca de 15 minutos, defendendo enfaticamente Figueiredo. Argumentou que a imprensa manipulara informações falsas e que Figueiredo teria anunciado trabalho anterior de 17 anos como advogado autônomo de múltiplas empresas do setor. Para Padilha, não há nada até o momento que desabone tal indicação.
A presidenta do CNS recuou então. Desistiu de pedir ao Senado a anulação da sabatina de Figueiredo, momentos depois de formular a recomendação.
“Foi intrigante assistir a defesa inflamada que o ministro Padilha fez do indefensável, mesmo depois de o escândalo ter levado a Câmara dos Deputados a aprovar a convocação de Elano e forçado a Casa Civil a encaminhar o caso para a Comissão de Ética”, diz, ainda surpreso, Mário Scheffer, que é ex-conselheiro nacional de Saúde. “O processo na Comissão de Ética está andando numa agilidade inédita, com sinais de que o diretor recém-nomeado da CNS pode ser afastado.”
Para a médica Ana Costa, conselheira do CNS e presidente do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes), Padilha intimidou o conselho, manifestando posição contrária ao debate e à deliberação em relação à grave sonegação de dados curriculares de Figueiredo.
“Desconheço as razões que levaram o ministro a adotar essa posição”, lamenta Ana Costa. “De qualquer forma, acho grave a tentativa do ministro de  fazer pressão junto ao Conselho Nacional de Saúde, que deve ser preservado como espaço plural, democrático e independente.”
Lamentável também o conselho se deixar intimidar numa questão tão delicada. Afinal, não é o primeiro nem é o único diretor plantado na ANS, que é ligado às empresas de planos de saúde.
E isso, todo o CNS sabe, é um dos fatores responsáveis pela fragilidade da regulação em saúde e permissividade de decisões, que geralmente favorecem o mercado, distanciando-se dos interesses dos segurados e, particularmente, dos interesses do SUS.

“Para agradar o ministro, o Conselho Nacional de Saúde ignorou todas as evidências de que houve fraude e de que há conflito de interesse nessa indicação à ANS”, frisa Mário. “Passou, ainda, por cima de várias entidades da sociedade civil que se mobilizaram para trazer a denúncia à tona e pedir a anulação da sabatina no Senado. O conselho se omitiu, aprovou uma nota ridícula, porque está aparelhado por interesses corporativos.”
Ana Costa arremata: “O CNS tem de se pronunciar firmemente sobre o assunto, rejeitando a intimidação e o aconselhamento do ministro. É o mínimo que a sociedade espera”.

 

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